terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Greta Garbo e feminismo no século passado



Greta Lovisa Gustafsson, mais conhecida como Greta Garbo veio para os EUA em 1925, para trabalhar em hollywood a convite de Louis B.Mayer, o poderoso magnata do estúdio MGM. Junto com ela veio seu amigo finlandês Mauritz Stiller, que foi o primeiro a dirigir um filme estrelado por Greta e também o principal motivo da atriz ter sido convidada por Mayer para fazer filmes na América. Mas, inicialmente a jovem sueca (Greta estava então com 19 anos) não se encaixava nos padrões estéticos de hollywood e teve que ser “remodelada” para se adequar a eles. Garbo perdeu peso, fez reparos nos dentes e alisou o cabelo para finalmente poder interpretar o seu primeiro papel em um filme americano em 1926 ,chamado “Os proscritos”.
De todas as coisas que li sobre a Greta Garbo, boas e ruins, me fez construir em minha mente não um personagem, mas um ser humano, com erros e acertos, sem maquineísmos, uma pessoa como qualquer outra. De personalidade tímida e retraída, que odiava os holofotes, e que ao mesmo tempo  teve contato com personalidades fortes e  ilustres como Wilson Churchill. Foi admirada e procurada por outras figuras famosas como Jacqueline Kennedy,
Como toda mente humana, sua personalidade se contradizia, pois por mais que odiasse as multidões e os paparazzis, escolheu como profissão ser atriz, e fazer parte de um dos maiores estúdios de filme da época. Endossou fofocas de todos os tipos, com homens e mulheres, e ao mesmo tempo que afastava as pessoas, parecia que seu mistério produzia um magnetismo nos mesmos ,que se viam atraídos por um olhar melancólico e sincero recato, que talvez nunca tenha sido a intenção de Garbo.
                Bem longe de fazer um relato psicológico da grande atriz Greta Garbo, minha intenção é falar no que esta personalidade teve de revolucionária na década de 20 até a sua morte, o que trouxe para nós nos dias de hoje que nos causa tanta admiração, seja pela sua coragem em viver a vida que desejava, seja por tomar atitudes que na época eram vistas com preconceito.
                Podemos dizer que Greta Garbo causou muita polêmica, principalmente no período que ainda estava em evidência na mídia, tanto pelas suas supostas amizades e relacionamentos com homossexuais da época(como Mercedes de Acosta, da qual trocou cartas durante muitos anos), tanto quanto pelos seus supostos casos . Apesar de nunca ter dado uma entrevista em que assumisse nada (durante sua vida toda concedeu apenas 14 entrevistas) e de deixar guardado a sete chaves sua vida pessoal,  muitas especulações foram feitas sobre sua sexualidade. Acreditava-se que fosse bissexual e que em diferentes períodos da vida tenha se relacionado ora com homes, ora com mulheres.
Algumas de suas ações poderiam projetá-la também como uam figura importante para o feminismo. Já na primeira metade do século XX  questionou as noções tradicionais de gênero, ao fazer uso de calças, que na época era considerado pouco feminino. De fato a calça só passou a ser usada pelas mulheres a partir da 1º Guerra Mundial, pela necessidade das mulheres de trabalharem, já que seus maridos e pais se encontravam na guerra. Essa peça de roupa era vista muito mais como uma necessidade do tempo do que realmente como uma roupa feminina. No entanto, com a 2º Guerra Mundial  e também com o uso constante por estrelas do cinema como Marlene Dietrich e Katharine Hepburn, e pela estilista Coco Channel, as calças femininas passaram a ser largamente difundidas e mais modelos criados.
Outra prova de seu questionamento dos papéis que eram impostos à mulher na sociedade de então, foi o desejo constante por fazer papéis masculinos no cinema, como o personagem Dorian Gray, magistralmente criado por Oscar Wilde e o clássico Hamlet de Shakespeare. Mas infelizmente nunca conseguiu com que a MGM aceitasse produzir um filme no qual Greta fosse descontruir toda a imagem que havia sido habilmente construída para ela: a de moça lânguida, feminina, um ícone daquilo que deveria ser mulher até meados do século passado.
Mais revolucionário, no entanto, que todas as decisões tomadas por Garbo, foi sua omissão. Ao se permitir nunca entrar em um casamento, em um período que as mulheres ainda sofriam muita opressão para serem verdadeiras mantenedoras do lar e por desempenharem seus papéis como “bibelôs da casa”, Greta quebra um “paradigma” sexista de seu tempo. Mesmo tendo se relacionado com diversas pessoas ao longo da vida, Garbo nunca se casou, sendo que propostas não faltaram (como a do milionário grego Aristóteles Onassis). Sabendo que sua timidez, solidão, melancolia e possíveis momentos de depressão não se conjugariam bem com o que poderia se esperar dela em um casamento, preferiu que seus relacionamentos interpessoais nunca chegassem a ser um compromisso timbrado em papel.
Em nenhum momento pretendo dizer, no entanto, que a coragem dessa mulher era do tipo pensado, pelo contrário, já que pela sua biografia percebemos que viveu reclusa muito tempo em seu apartamento em Nova York com medo de ser reconhecida na rua e virar notícia de tablóide. Mas como havia dito, é uma personalidade contraditória, e ao mesmo tempo que havia aspectos de covardia em si, havia coragem em outros. Acredita-se que tenha inclusive feito 2 abortos quando ainda estava nos estúdios MGM e pagos por este, em um período em que os métodos contraceptivos ainda eram muito primitivos e ainda não existia a pílula (criada na década de 60). Podemos imaginar como deveria ser difícil para uma mulher se submeter a tal procedimento em um período em que o aborto ainda era ilegal nos EUA (só foi legalizado em 1973) e que não existia todo o aparato atual da medicina para tornar o procedimento rápido e seguro.
 Finalizo esse texto concluindo que o feminismo é muito mais do que uma ideia que se contrapõe ao patriarcalismo, ao sexismo e a misoginia. O feminismo ele surge de pessoas como Greta Garbo, que através de suas escolhas de vida, contrariaram completamente os papéis que a sociedade tentou lhes atribuir. Ele surge assim como uma forma de ver e viver a vida que não se prende a padrões predeterminados do que é ser homem ou do que é ser mulher. Ele tem em vista que cada um deve e pode desempenhar o papel que quiser em sua própria vida. E nesse sentido Greta Lovisa Gustafsson soube fazer isso muito bem.

P.S.: Agora esse artigo estará disponível na revista Obvious: http://obviousmag.org/escritos_desafinados/2015/02/greta-garbo-e-o-feminismo-no-seculo-xx.html
E quem quiser poderá acompanhar outros artigos meus através da Obvious: http://obviousmag.org/escritos_desafinados/autor/

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Solidão X Socialização


    Uma das ideias que mais marcou a minha vida até hoje era que a de que o lar era o lugar onde está a(s) pessoa(s) que você ama. Então, sempre tive comigo que não importa onde eu estivesse, o mais importante seria quem estaria comigo percorrendo esse caminho. Não foram poucas vezes, no entanto na minha vida que tive vontade de fugir de tudo, de fugir de mim mesma e de todos e ir para um lugar que eu não conhecesse ninguém, onde fosse uma completa estranha. Mas, junto com esse pensamento, também me vinha na cabeça as pessoas que eu deixaria para trás. E outra pensamento que surgia é que eu nunca poderia fugir de mim mesma, não importando para onde eu fosse, a única pessoa que estaria ali presente a vida toda seria eu mesma. Já as outras pessoas, algumas nós escolhemos estar perto e outras foram obra do destino/acaso, como as pessoas da nossa família. O que importa é que não conseguimos desfrutar o mundo e ser felizes sem o outro. É através da alteridade que nos compreendemos, que fazemos sentido e o mundo também. É através do outro que nos percebemos com nossas falhas e acertos, com nossos defeitos e qualidades. Só pelo contato, a convivência com o próximo é que conseguimos compartilhar as nossas experiências, sentimentos, visão de mundo, superstições e conhecimento. Até o conhecimento mesmo por si só não faz sentido, se não é compartilhado com alguém, se não é dividido e saboreado com o outro. Sem outro olhar, estamos fadados a estreiteza de visão, a enxergar o mundo em uma cor só, a viver dentro da caverna de Platão. Só, apenas como um indivíduo, acrescentamos algo a sociedade, mas esta está sempre também nos modificando, pois a corrente das massas, vai inevitavelmente carregando os indivíduos nela.
    Como indivíduos temos ideias geniais, impulsionadas pela massa pensante e disforme da sociedade. Estamos sempre criando em um movimento de simbiose que vai do indivíduo pra sociedade e vice-versa. Não creio que existam ingênuos que acreditem que possam viver sem outros indivíduos, sem outros serem humanos que lhes tragam algum tipo de completude ou que lhes possa produzir um sentimento de alegria genuíno, causado pelo simples fato que nem tudo podemos fazer sozinhos, e que sempre vamos precisar do outro. Talvez daí tenha surgido o sentimento de humildade em nós, como nos apercebemos eternamente dependentes de outros seres vivos para continuar vivendo, da caridade de quem nos detesta, como diria Cazuza. Não só quando crianças ou velhos, mas ao longo de nossas vidas frágeis, necessitamos do outro, não como uma muleta, mas como um verdadeiro indivíduo co-depende de outro. Não somos nada sem o outro e outro não é nada sem nós, e assim vivemos todos na interdependência do próximo.
    Mas onde eu quero chegar com toda essa volta, é que por mais que em diversos momentos da minha vida a solidão me acometa e eu acabe sentindo alegria por ela me visitar, eu sei que no fundo não somos indivíduos completos sem os outros e não crescemos e nos tornamos pessoas vividas e com diversas experiências de vida sem esse contato. Somos seres sociais, independente do quão solitários possamos ser ou nos sentir em alguns momentos. E esses momentos de solidão são verdadeiros tesouros para algumas vezes refletirmos quem somos e quem queremos ser, assim como também para simplesmente curtir a nossa própria presença.

 Estou lendo o livro da Mónica Ojeda, chamado Madíbula. É um livro incrível no sentido de que, mesmo eu já tendo muitas coisas que me arrepi...